A recente estreia do personagem Dr. Estranho nos cinemas, vem num momento propício para ressaltarmos que o ser humano não é somente físico, ou seja, feito somente daquilo que podemos constatar com nossos sentidos da visão, tato, audição, olfato e gustação.
O personagem que é neurocirurgião, foi criado na década de sessenta por Stan Lee e Steve Dikto para o Universo Marvel. Após sofrer um acidente grave e ficar sem os movimentos das mãos e sem esperança de melhora pela Medicina Ocidental, procurou ajuda em Práticas Orientais.
Iniciou então a desafiante viagem por caminhos nunca trilhados, aprendendo a ter olhos para si mesmo como ser multidimensional, constituído não apenas de substâncias de carne e osso, mas também de outros corpos como o energético, emocional e astral. Além de aprender que mente tem um significado maior do que apenas ao que se reduz, o limitado cérebro.
Aprendendo sobre si, ele viu melhor o outro, identificando-se ainda mais. Descobriu o significado da empatia e compaixão abrindo-se para sua verdadeira vocação.
Exageros à parte de todo filme de ficção e que precisa gerar lucros, esse assunto traz abertura para falarmos de ciência, ou melhor, Neurociência e o avanços que ela traz no uso da Meditação na promoção da saúde e bem-estar e no tratamento de várias doenças do psíquico e do corpo.
Em Medicina, muitas vezes, graças à prática médica quase diária, observamos muitos fenômenos que não conseguimos explicar pela ciência até um determinado momento, mas que são resultados óbvios. Um trabalho científico para ser aceito, precisa ter um modelo e ser reproduzido. Às vezes não dispomos naquela ocasião de recursos para comprovação. Logo, aceitamos os vários graus de evidência e podemos indicar as terapias, desde que não haja efeitos colaterais ruins. Não devemos fechar os olhos para algo só porque não podemos explicar, simplesmente porque o que sabemos ainda é muito pouco.
Há muito, observamos que as pessoas que acreditavam em algo além, ou seja, tinham alguma religião ou praticavam regularmente orações ou meditação, encaravam melhor suas enfermidades, ou apresentavam mais chances de cura e/ou amenização de sua doença. Essas pessoas tinham algo em comum, a segurança da melhora e uma postura mais positiva perante as condutas e oscilações intrínsecas dos tratamentos.
A Neurociência sempre estudou estes casos e tentou traduzir para os trabalhos científicos, mas não encontrava o link que faltava. Será que as pessoas que tinham uma religião eram mais felizes do que as que não tinham, e por isso, saiam-se melhor? O que é felicidade?
Não foi difícil perceber que felicidade ou tristeza não está associada a fatores externos (situação financeira, doenças, relacionamentos, circunstâncias políticas e sociais) e sim a fatores internos, ou seja, como lidamos e experienciamos as situações.
A ansiedade é traduzida como uma propensão do ser humano em sofrer por antecedência, baseando-se em experiências de frustração prévias. Ou seja, forma-se um condicionamento que provoca sofrimento ao menor sinal de que a situação vai se repetir. O estresse perturba a nossa percepção e tomamos a atitude incorreta. Causamos a repetição dos resultados!
As pessoas que oram regularmente ou meditam tinham um grau menor de ansiedade e isso fazia toda a diferença. Mas, como estudar melhor o cérebro dessas pessoas? Como elas conseguiam mudar o comportamento? Existiria um local do cérebro para isso?
Nos últimos vinte anos, com o desenvolvimento da Ressonância Nuclear Magnética Funcional, a ciência vem fazendo pesquisas com meditadores que praticam com regularidade e nos vem agraciando com respostas surpreendentes.
A RNM Funcional consegue avaliar todos os tecidos cerebrais e diferenciar entre eles. Consegue definir com acurácia, a região anatômica, se estamos no córtex ou substância branca, e consegue verificar qual a região está sendo usada no momento em que o indivíduo executa tarefas ou tem algum tipo de pensamento.
Graças a neuroplasticidade, que é a geração de novas conexões entre os neurônios, ocorre o aumento das pontes elétricas responsáveis pelo funcionamento do cérebro e temos a real possibilidade de mudar. Hoje sabe-se que as conexões podem ser modificadas em qualquer idade, gerando mudanças funcionais e até mesmo de estrutura, embora, em menos velocidade (quando comparado a um cérebro mais jovem). O cérebro procura novos caminhos e se adapta se estimulado repetidamente a isso.
Grande parte das pesquisas foram realizadas por uma neurocientista de Harvard (Dra. Sara Lazar), inicialmente incentivada por experiência própria.
A Dra. Sara sofreu uma lesão enquanto preparava-se para uma maratona. Durante as sessões de fisioterapia, indicou-se a Ioga onde há meditação com exercícios de respiração. Mesmo sem saber exatamente o que estava fazendo, ela percebeu mudanças em seu estado mental e psicológico, que se refletiram em suas atitudes no dia a dia, para melhor. Observou os resultados em si própria e foi atrás das respostas.
Com o auxílio de Tomografias e Ressonâncias Funcionais, descobriu que o córtex pré-frontal de quem medita tem mais massa cinzenta que os que não meditavam. Essa região, entre aqueles que meditavam de longa data, aos 50 anos era compatível com a idade de 25 anos. Sabemos que a medida em que envelhecemos, o córtex perde neurônios (diminuição da substância cinzenta). O córtex pré-frontal está associado com memória de trabalho e tomada de decisões. Outro achado é que, há um aumento na massa cinzenta da ínsula, córtex auditivo e sensorial.
"Durante a meditação, treinamos atenção à respiração, sons, odores e à experiência total do momento presente. Logo, há um treinamento dos sentidos e ampliação dos mesmos"
Outras regiões também tiveram aumento de massa cinzenta:
• O hipocampo da esquerda, relacionado ao suporte ao aprendizado, cognição, memória e regulação emocional.
• A junção temporo-parietal, à qual está associada a tomada de decisões, empatia e compaixão.
• Uma parte do tronco cerebral chamada ponte, onde grande número de neurotransmissores são produzidos, também aparece amplificada.
A amigdala, parte do cérebro responsável pelo instinto de ataque ou fuga, e que é importante nos aspectos da ansiedade, medo e estresse, ficou menor no grupo que participou do programa por oito semanas de atenção plena, com foco na redução do estresse e que foi significativamente alcançado.
A Dra. Elisa Harumi Kozasa, pesquisadora e docente do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein na área de Psicobiologia, publicou um trabalho em 2012, no qual mostrou ser possível diferenciar a estrutura cerebral de meditadores e não meditadores, com 95% de precisão.
A meditação vem sendo utilizada há pelo menos mais de 5000 anos para treinar e controlar as funções mentais. Observamos seus benefícios em todos os setores da prosperidade, social, espiritual, mental, emocional, relacionamento familiar e no trabalho. Desequilíbrios nestas áreas refletem, em última análise, na debilidade do corpo.
Como terapia complementar, a meditação está sendo muito utilizada no tratamento da dor, nos desequilíbrios de imunidade, na melhora da concentração, da ansiedade, do estresse, na insônia, na depressão, no controle da hipertensão, no retardamento dos efeitos do envelhecimento e no apoio ao tratamento do câncer.
Alguns estudos mostram que meditação age nos mesmos sítios de alguns antidepressivos e ansiolíticos, sem os efeitos colaterais dessas drogas.
Mas esses são apenas os efeitos finais de modificações reais de comportamento e na maneira como cada um tem suas experiências. A diminuição do efeito da ansiedade, traz um estado de presença, com clareza nas avaliações e decisões momento a momento, enriquecendo sensações mais elevadas, como empatia, compaixão, bondade e melhor controle das funções psicológicas de autodomínio e autoconsciência.
Qualquer um pode ter benefício e ainda não se sabe por quanto tempo precisamos meditar diariamente. Resultados iniciais mostram que em 3 a 4 semanas, já obtemos alguma melhora no comportamento. A intenção e a vontade de melhorar são essenciais para o resultado, assim como o treino metódico e as práticas diárias. Afinal, poderemos ter as alterações funcionais e até anatômicas, visíveis.
Há necessidade de um médico para o diagnóstico correto das doenças físicas e mentais, mas a meditação é um recurso magnífico para o bom resultado dos tratamentos, assim como a psicoterapia, higiene do sono, dieta saudável e exercício físico.
Somos seres complexos e de muitas dimensões, e só teremos sucesso nos nossos objetivos se agirmos com essa coerência e abordarmos o indivíduo em todos os seus planos ao mesmo tempo. .
Dra. Elaine Cristina Lima - Neurologista
Com mais de 16 de anos de experiência vividos em Medicina,
na área de Neurologia com MBA Executivo em Saúde;
Expertise em Neurologia e Clínica Médica;
UNIFESP
Instituto Neurospine Telefones: (11) 3051-2543 e (11) 97607-9728